segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Os Povos do Meu Povo

No povo onde povoamos
Eu e o povo
Há muito povo
Povo que nada diz
Que tudo diz
Povo que nunca quis
Ser povo
Ser feito povo
Ser chamado povo

Tem povo grande
Povo gordo
Tem povo corvo
Que come
Fica preto
Não engorda
E come

Povo que manda
Que anda
Mas não sobe chapa

Tem povo que canta
Que grita
Povo que rouco de cantar fica
Rouco de ficar rouco

Tem povo que escreve
Que juntas estrelas
Areias da praia
E se diverte

Povo que com palavras
Escritas
Nada diz tudo diz
Come e na engorda
Grita e fica rouco
Mas escreve
E vive
E fica povo

Tem povo que anda
Que se esfomeia
Povo que trabalha e cansa
Tem povo que vai e vem como onda do mar
Sobe chapa cem, duzentos, trezentos
Chapa mil
Sobe e desce como ondas do mar
Povo que vai ao mar e não traz peixe
Porque o povo já pescou
E não deixou peixe para o povo

Tem povo que morre
No fogo e na morte
Povo que morre nas mãos do povo
Povo que tira o peixe que o povo não pescou
E povo não fica calado sem peixe
Mata o povo com seu próprio povo

Tem povo que espera
Nas margens do rio
Povo que pensa que o Zambeze
Deixará de ser rio
Sairá do leito
E ficará nas margens
Esperando que o Save
Deixe de ser rio

Povo que só chora
Não canta
Nem Dança
Não escreve e nada alcança

Ah! Tem muito povo esse meu povo
Povo que nada diz
Que tudo diz
Povo que nunca quis
Ser povo
Ser feito povo


É tanto povo que nem sei
Qual é o meu povo
Que povo sou eu

Nelson Livingston

2 comentários:

Kidjomalu disse...

Sublime "Os Povos do Meu Povo"!
Estou povoadamente povoada pelo povo do meu povo.
Bela metafora do nosso hoje, porque mentir?
Do nosso amargo amanhã

Anónimo disse...

Porque mentir?
Podemos até mentir pra lua e pro sol
Mentir para o mar e as estrelas
Mas mentir pro nosso próprio umbigo
Pra alma que trazemos dentro de nós?
Como?
Nelson Leve